Aproveitando as reflexões deixadas pela Camila, fiquei pensando nos diferentes relacionamentos que existem no fazer musical - mais especificamente o fazer musical "solitário" e "fora do tempo", no qual me encontro constantemente.
Existe um relacionamento que antecede a primeira nota, o primeiro som; antecede até mesmo o silêncio que prepara para esse marco (e que funciona como ‘conjunto vazio’ da peça toda). É o relacionamento hipotético que se dá entre o compositor e uma abstração: a soma das escutas dos ouvintes. Normalmente é para esse polinômio estranho (x1 + x2 + x3 ... + xn / n) que o compositor pensa o primeiro momento. Disso parece resultar um dos teoremas da modernidade: O número de escutas (“n”) levadas em conta pelo compositor é inversamente proporcional ao hermetismo do trabalho – imaginamos então uma situação limite onde uma peça é escrita para apenas uma escuta.
Afastando-se do primeiro momento da peça, surge o relacionamento metalingüístico da peça com ela mesma (‘o que acontece’ em relação puramente musical com ‘o que aconteceu’) e da peça com relação ao repertório (em uma relação lingüística e também sociológica, blá blá blá né).
Em ‘música para dança’ temos ainda a adição de outras relações: lógicas musicais e lógicas da ordem do movimento; lógicas da afetividade musical e da afetividade coreográfica; lógicas cênicas, plásticas etc.
Se toda essa somatória tende a virar uma espécie de lodo teórico, a cada vez que penso a respeito, vejo que ‘criar’ é uma ação que ganha energia da fricção [e da nossa tomada de consciência] dessas tantas forças simultâneas. Nesse sentido, a obra é uma faísca nascida de um ajuste fino, de um mirar contínuo.